A tal da postura, o equilíbrio e o core
20/06/2017O colega colunista Felipe Cazolari escreveu recentemente um ótimo texto sobre postura [se você ainda não leu, pare o que está fazendo e clique aqui], que sabemos bem ser um termo que engloba um conjunto de fundamentos do muaythai. Se você é treinador, com certeza essa palavra é repetida por você inúmeras vezes ao longo dos treinos e das aulas comerciais. Se você é aluno ou atleta, já foi cobrado por isso até a exaustão. Porém, ainda é muito comum ver essa palavra ser repetida insistentemente, porém sem muita fundamentação, o que me levou a querer escrever sobre o assunto.
É claro que atletas e alunos de longa data já estão cansados de saber o que é ser posturado, mas não adianta ficar ao lado de um iniciante repetindo “postura” sem parar, porque ele não vai entender o que está fazendo de errado. Então, vamos lá. Como disse antes, a tal da postura se refere a um conjunto de fundamentos básicos. Em geral, podemos resumi-los em cinco pontos fundamentais que podem ser aplicados nos diferentes momentos e estilos: técnica, força, velocidade, movimentação e equilíbrio. Assim, um lutador ideal seria capaz de combinar perfeitamente cada um deles, alinhando-os ainda a um último quesito extremamente importante, que é mostrar-se forte (como o Leo já fez um Muaytemática bem completo que explica bem o assunto, não vou me aprofundar. Se quiser saber mais sobre isso, clique aqui).
Técnica: é um termo muito genérico, mas que será aplicado aqui para designar o conjunto de gestos corporais que compõe cada movimento. Como sabemos, cada golpe é composto por diversos detalhes, que influenciarão a eficiência alcançada. Para um simples chute, por exemplo, é necessário se atentar à rotação e elevação do calcanhar, movimento de quadril, movimentos de ambos os braços e posicionamento para que seja a canela a atingir o alvo. Acertar essa movimentação leva tempo e demanda atenção, paciência e muita repetição. Como qualquer outro golpe. É claro, a técnica está intimamente ligada à movimentação e, principalmente, ao equilíbrio.
Força: nesse caso, podemos considerar como o impacto e o dano que causará a seu adversário. Além de estar relacionada à estrutura física do atleta, a força também será desenvolvida com o aprimoramento da técnica.
Velocidade: é comum que os iniciantes associem esse fundamento muito mais com a força do que com a técnica. Ou batem forte e rápido, ou devagar e fraco. Com muita repetição torna-se possível dissociar os dois.
Movimentação: é importante citá-la, já que uma luta não ocorre o tempo todo parada. É comum o praticante fazer uma repetição de golpes plantado no mesmo lugar ou pulando como um macaco de um lado para o outro. Esse é um dos fundamentos que teve grandes mudanças nos últimos tempos. E é super comum que quando a técnica seja aplicada em movimentação, perca-se o equilíbrio.
Equilíbrio: é, na minha opinião, o fundamento mais importante. É o que faz alguém lutar bonito, porque não adianta saber girar o quadril direitinho na hora de chutar, mas não conseguir voltar para a base depois.
Então o equilíbrio é importante porque vai fazer você lutar bonito? Não! Afinal de contas, tem um monte de lutador por aí que não luta tão bonito, mas varre a categoria porque compensa na maloqueiragem e no coração. O equilíbrio é tão importante porque ele afeta cada um dos outros fundamentos. Sem ele é impossível executar os movimentos de forma eficiente, o golpe não será tão forte quanto poderia, ou tão veloz, e não é possível se movimentar sem equilíbrio. E muito menos se defender. Como você vai bloquear um chute se ao dar teep cair com o corpo para frente? Ou quando você chutar acabar ficando de lado? E isso não é coisa de iniciante não, tem muito atleta com certa experiência que ainda faz isso — é claro que erros acontecem e ninguém espera que você nunca perca o equilíbrio, mas isso deve ser a exceção e não a regra.
O que mais me chamou a atenção quando fui ao meu primeiro seminário com Adaylton Freitas foi exatamente isso. Não importava o movimento que ele fizesse, ele sempre voltava para a base exatamente da mesma forma que havia saído. Quando ele se movimentava, isso não alterava em absolutamente nada a base dele. É claro que para quem está começando pode ser difícil fazer isso, especialmente quando você está pensando em cada um dos detalhes do seu chute, mas o que é pouco abordado e que você adquire com o tempo é a consciência corporal.
Parece até idiota dizer que é você quem controla seu corpo, mas para quem está chegando agora, os movimentos saem quase no automático, e às vezes é até difícil perceber o que exatamente está saindo errado. Então, não tenha medo de encostar no seu aluno e indicar onde ele precisar se movimentar corretamente, e nem preguiça de fazer o movimento devagar e repetidas vezes. Mas o principal é: faça ele entender que é ele o responsável pelo equilíbrio dele.
É importante explicar a importância da movimentação do que chamamos de core, que basicamente se constitui do centro do nosso corpo e, em especial, abdome e lombar. A atenção sobre o posicionamento do core durante cada golpe é essencial, e o fortalecimento dessa região é um ótimo primeiro passo para ajudar no equilíbrio do atleta — o que pode ser feito através de musculação, treinamento funcional, mas também com a parte física do próprio treino de muaythai (afinal, o objetivo daquele abdominal de fim de treino não é simplesmente deixar você com tanquinho).
Além disso, o fortalecimento do core trará estabilidade ao quadril e à lombar, pode intensificar força e potência de outros grupos musculares, e ainda será um grande aliado na absorção de golpes e auxílio à respiração e melhor aproveitamento do seu gás. Um dos principais exercícios para isso é o odiado pranchão.
Resumindo, tudo está interligado: força e velocidade dependem de técnica; técnica e movimentação só podem ser bem executados com equilíbrio, e um bom preparo físico é um grande atalho para se conquistar tudo isso. Tudo aliado à boa e velha repetição, repetição, repetição.