Cuidado com o cabresto
30/05/2017Rotina é uma palavra que eu particularmente não gosto muito, viver na rotina se torna chato, os dias parecem todos iguais, dá a impressão que vivemos no modo automático e não prestamos muita atenção no que acontece ao nosso redor. Mas pensando em Muaythai não tem jeito, precisamos disso, não temos como fugir dessa tal rotina.
Muaythai é repetição, acho q a maioria já ouviu isso 1 milhão de vezes e entendeu. Tanto para aperfeiçoar movimentos como o próprio treino em si. Corrida, corda, sombra, saco, Tpao, sparring, clinch, físico. Diariamente num ciclo sem fim.
Quando começamos tudo é lindo, até os primeiros anos tudo é relativamente novo. Porém com o passar do tempo se tem uma estagnação natural e essa rotina acaba saturando corpo e mente.
Não que já se saiba tudo, aliás longe disso, mas novidades já não são tão frequentes e fazer isso todo santo dia, durante anos o amor realmente tem que ser muito grande para persistir e principalmente se manter motivado.
Essa é uma das grandes causas de muitos atletas pararem de lutar ou pelo menos de treinarem tanto. Se fizermos uma enquete com ex atletas perguntando se têm saudades posso apostar que mais de 90% irá responder: “De lutar sim, de treinar não!”.
O treino duro é o caminho para se chegar a objetivos maiores. O foco, a motivação devem estar nas competições, nas futuras conquistas, na grana que sonha em ganhar, em fazer seu nome ser reconhecido e respeitado.
Quem consegue ir para fora do país isso fica mais fácil já que consegue lutar com maior frequência, nesse caso o treino duro todos os dias faz mais sentido do que aqui no Brasil. Lá se treina já sabendo que tem luta marcada ou sabe que pode aparecer do dia para a noite, já aqui se o atleta conseguir lutar uma vez por mês tem que levantar a mão para o céu e agradecer, pois na maioria da vezes treinam duro e não têm a mínima ideia de quando terá uma oportunidade.
Quem passa uma temporada fora e volta entra em colapso e não vê a hora de voltar.
Já melhoramos muito nesse quesito, hoje temos muito mais eventos, os atletas de card preliminar (que não recebem bolsa) conseguem lutar muito, rodar bastante, mas quando chegam no profissional já não é assim tão fácil.
Para diminuir um pouco essa “problemática” dos treinos e tentar manter os atletas motivados em treinar por treinar até que se chegue a um compromisso real podemos variar essa rotina dentro da própria rotina, procurando possibilidades de acordo com o cronograma de treino de seu treinador, lapidando suas próprias características e dificuldades.
Devemos sim seguir os pilares do treinamento citados acima, porém não precisam ser trabalhados sempre da mesma forma.
Se todas as equipes treinam igual o que diferencia uma equipe que faz um campeão atrás do outro de outras?
Muitas podem ser as repostas, treinador e atleta fazerem seus papéis com afinco e responsabilidade, estrutura da academia, material humano disponível para o treino, etc. E talvez uma das respostas pode ser essa: A capacidade que cada treinador tem de enxergar e refletir no treino diferentes possibilidades usando esses pilares.
Correr? Ok! Mas podemos variar distância, intensidade, percurso.
Tpao? Completo; Manoplas; Mão e chute coxa; Clinche, etc
Saco de pancada? por round; tempo corrido; só boxe; só cotovelo e joelho; Tábata, etc.
Sparring? completo; boxe; pegadas de chute; alternando e limitando movimento como um só pode usar mão, outro só pegar de joelho, etc.
Até no clinche podemos variar, fazer direto todos juntos; fazer uma roda e todos vão em um só; ou ainda sempre que um cair outro entra, etc. Na parte física também podemos variar bastante.
Enfim, essas são apenas algumas das muitas alternativas, o treino todo abre um leque infinito de possibilidades e fazer a rotina menos maçante, e muito mais específica treinando dificuldades e potencialidades de cada um.
O que acontece é que existe infelizmente muito treinador preguiçoso, que mal coloca material para comandar aparador, e com certeza não irá perder tempo elaborando treino, analisando o que um atleta precisa mais e como pode resolver.
É mais fácil no treino só falar “vai para o saco, vão clinchar, agora faz sparring”. Lógico que a maioria dos dias é o que acontece e não está errado mas por que não de vez em quando pensar nisso? Se foi o que escolheu para fazer deve se dedicar de corpo e alma nisso e pensar em seus treinos.
O trabalho não é fácil se ainda for chato estaremos ladeira abaixo a caminho do fracasso. Ser treinador no Brasil é assinar um atestado de loucura e acumular funções de manager, headcoach, padman, empresário, big boss, matchmaker, psicólogo tudo isso sem retorno financeiro que valha a pena e muitas vezes ainda aliando com jornadas em outro trabalho além de conciliar tudo isso com sua família.
O que estou dizendo aqui é para tirar o cabresto que nos colocaram, abrir a mente e variar métodos, estratégias e dinâmicas dentro do que é o Muaythai. Mas para isso é importante que o treinador tenha bem consolidado em sua mente o que é Muaythai, seus princípios, fundamentos e regras. Não confunda o que estou dizendo com fazer loucuras, misturar outras artes marciais ou inventar macaquices.
Vamos fazer a rotina. Repetir movimentos até cair a perna se for preciso, mas dentro do possível variar essa rotina dentro da própria rotina com o intuito de manter a motivação e evoluir ainda mais tecnicamente nossos atletas.