Na alegria e na tristeza

Na alegria e na tristeza

27/09/2016 1 Por Nathalia Viana

A relação entre técnico e lutador é algo sagrado. Trata-se de muito mais que uma condição de professor e aluno, porque a partir do momento que você decide entrar em um ringue, você precisa saber que não estará sozinho. Você não estará sozinho nos treinos árduos que se estenderão até tarde, você não será o único a perder compromissos porque todo dia é dia de treino, você não vai suar sozinho, não vai sentir dor sozinho.

Quando seu treino já te levou à exaustão, seu treinador já chegou àquele ponto tantas outras vezes, pois você é o segundo, terceiro, quarto atleta que ele treina naquele dia… Se suas pernas não aguentam mais chutar, são os braços cansados dele que seguram o aparador.

Você precisa saber que pode contar com ele para qualquer coisa. Se você está cansado demais, é ele quem vai ouvir sua lamentação, se você está com dor, é ele quem vai massagear suas pernas ou te mandar para o gelo ou dizer que não interessa o quanto você ache que já está recuperado, você ainda não vai chutar hoje. E quando ele finalmente disser que você está pronto, você precisará confiar totalmente nele.

Ninguém sobe no ringue sozinho. O atleta carrega com ele não só o seu sacrifício, mas o esforço e o empenho de todos que ajudaram na sua preparação, os colegas de treino que o incentivaram, o nutricionista que cansou de ouvir que você está passando fome, a família que aguentou o mau humor, o choro, o cansaço, a dieta… Mas nada se compara à responsabilidade do treinador, porque vocês compartilharão vitórias e derrotas, e na hora do vamos ver, é só a voz dele que você vai seguir. Se você ouve um comando do seu treinador e tem dúvidas, é porque algo não está certo.

Talvez dizer isso pareça algo utópico, já que nenhuma relação é perfeita e nós somos seres complexos, cheios de dúvidas e incertezas. É claro que você já sentiu raiva ou discordou do seu treinador, da mesma forma que ele já ficou irado com seu atleta e cansou de te chamar de teimoso, isso faz parte. Mas é a confiança que precisa ser inabalável. Você precisa acreditar que ele sabe o que está fazendo, que o caminho que ele te aponta é o melhor, porque se você começar a duvidar disso, tudo vai por água abaixo. Tudo pode ser resolvido, mas quando atleta e treinador deixam de acreditar um no outro, é um caminho sem volta.

Tudo que o atleta faz passa por seu treinador. A rotina de treino, o peso, a alimentação, a escolha dos oponentes e, claro, o corner. E nesse momento, não tem jeito, é a estratégia dele e a sua cara estão lá. Se você não confia na estratégia dele, como ter coragem de dar sua cara para bater?

A relação inversa é a mesma coisa. O treinador precisa acreditar no seu atleta, saber que ele não está fazendo corpo mole quando diz que não dá mais ou que está machucado, precisa acreditar que toda a dedicação dele para seu atleta não é à toa e precisa saber que o atleta confia nele, que vai seguir seus comandos quando subir no ringue, porque se o atleta perder, a derrota também é dele, é o trabalho e o esforço dele que estão ali no ringue.

Desde que decidi que iria lutar, minha relação com tudo e com todos mudou muito. Vejo meus companheiros de treino com muito mais respeito e cada incentivo deles vale muito, além disso, vejo eles todos os dias e divido com eles o meu sonho e a rotina que ele me impõe. Passo mais tempo na minha academia do que em casa (pelo menos enquanto estou acordada), e cada um dos meus treinadores tem meu profundo respeito e admiração. Sei que eles também estão abdicando de muito para me treinar, que eles também têm cansaço, preguiça e que estariam mais confortáveis em casa passando o tempo deles com suas famílias. Mas foi essa loucura do esporte que nos conquistou e que nos une, que faz com que o meu sonho de vencer também seja o sonho deles. Mas a relação entre treinador e atleta é quase como um casamento, começa forte e cheia de sorrisos, mas exige muito dos dois lados para se fortalecer. Às vezes dá certo, às vezes não, mas quando a relação é verdadeira mesmo depois do término sempre fica aquele desejo de ver o outro bem.