Tpao é uma arte
02/05/2017O Tpao ou trabalho de aparador é um dos pilares de treinamento no Muaythai, talvez o mais importante. Onde o treinador tem o contato mais próximo e consegue sentir realmente sua evolução, corrigir, moldar e mostrar o caminho para um atleta.
Um bom trabalho de aparador depende de muitos fatores mas é primordial que o treinador saiba o que está fazendo e o que deseja do atleta ali no momento, tenha um objetivo naquilo e não só ficar pedindo golpes aleatórios, sequências repetidas e tomando bica nos braços sem um fim definido.
Devemos sempre levar em consideração as características físicas e habilidades específicas do atleta ao qual estamos trabalhando, explorá-las ao mesmo tempo em que detectamos e corrigimos suas deficiências.
E o mais importante devemos conhecer as regras e o maior leque de repertório técnico possível do esporte e sempre trabalhar em cima disso. Equilíbrio, postura, força, o que vale mais o que vale menos, o por que de cada situação, como chegar nela, como evitar, mecânica e variação de movimentos e assim por diante.
Pregamos que no Len Cheung o uso de força deve ser de leve a moderada, brincar de Muaythai, trocar técnica e não porrada, conseguir pensar, enxergar o jogo. E isso é uma verdade.
Então a hora de usar a força num confronto é justamente aqui, nos Pads. Bater forte como irá fazer na luta, digo sempre a meus atletas menos experientes, “estamos lutando ok?” Seria muito legal se numa luta apenas batêssemos, porém não é o que acontece, apanhamos as vezes até mais do que gostaríamos não é mesmo? Então treinadores, devemos sim bater em nossos atletas durante o trabalho, chutar, socar, joelhar, clinchar, afinal, É UMA LUTA! Atleta com força e treinador batendo nas brechas explorando nas falhas, mostrando onde está errando e o caminho certo.
E já que estamos lutando é essencial nos movimentar corretamente e não a cada dois golpes abaixar os braços e mudar de direção como vejo muito. Manter a postura durante todo o round, braços erguidos e atenção.
A chave principal é simular uma luta. Seja o adversário de seu atleta. Caso esteja em preparação para uma a qual conheça o oponente é extremamente interessante e válido simular até o jogo que costuma usar, movimentação, como golpear e criar estratégias para anulá-lo e como pegá-lo, e claro, treinar em cima dela no trabalho. Se oponente é canhoto se manter mais nessa base. Se clinchar buscar essa situação. Se é um cara que gosta de andar, de chutar, e assim por diante.
Existem alguns tipos de trabalho que podemos variar. Tpao, manoplas, apenas mão e chute coxa, somente cotovelo e joelho, freestyle, etc. Nosso material de trabalho são os ThaiPads, manoplas, cinto e caneleiras, e é importante lembrar que eles não estão ali de enfeite, não servem apenas para sair bonito nas fotos, devem ser usados.
Golpes como teeps, joelho, mão na linha de cintura o alvo deve ser o cinto e não os pads. No joelho por exemplo os Pads estão ali apenas para absorver um pouco o impacto e não deixar o joelho subir, mas o alvo deve ser o cinto.
Autonomia e iniciativa também são importantes nesse trabalho. Golpear, pensar e golpear, não fazer um negócio 100% direcionado. Principalmente esses golpes no cinto o atleta deve ter autonomia para executar sem o pedido direto do treinador. Quanto mais trabalhar com um atleta maior será o entrosamento e isso irá fluir com maior naturalidade.
Treinador não pode ter medo dos golpes. Se foi essa a vida que escolheu se vira malandro, seu atleta deve ter firmeza na execução e para isso depende muito de você. Fugir do golpe ou bater demasiadamente de encontro afim de amortecer são “erros” comuns. Lógico, deixe o braço firme, dê um tranquinho de leve para não receber o golpe inteiro, mas vejo treinador bater com o pad junto com o golpe quase na mesma intensidade, ou fugindo dele o que é pior. São situações que podem lesionar o atleta e atrapalham muito a execução, qualidade e noção de distância dos movimentos.
Assim como os atletas, nós treinadores devemos estar sempre com uma base firme, posturados, equilibrados e saber a maneira correta de se posicionar e posicionar os equipamentos para receber o impacto. Nossa própria segurança depende disso, em não tomar um golpe inesperado e também evitar lesões comuns como hérnias de disco, tendinite em cotovelos e ombros, etc.
Se possível invista em materiais de qualidade que absorvam melhor o impacto e preservem suas articulações, isso é essencial para que possa assim prolongar suas atividades.
Cada treinador tem suas características ao comandar. Uns corrigem muito, outros puxam mais o gás, outros pedem muitos movimentos isolados, outros te batem muito. Cada escola tem suas “especialidades” mas a questão aqui é deixar um pouco de lado as preferências pessoais e enxergar a necessidade de cada atleta e o melhor caminho para orientá-lo a seguir. Terão as características da escola e cada um suas características pessoais. Indivíduos diferentes, necessidades e potencialidades diferentes. Não é porque gosta de ver um Muaykhao lutando (o que aqui está na moda hoje em dia) que todos seus atletas serão assim, não force a barra, tenha sabedoria e extraia o melhor de cada um.
Todo dia seguimos aprendendo, comandar aparador é uma arte que deve ser aperfeiçoada dia a dia, vendo vídeos de treinadores tailandeses, conversando com nossos colegas de profissão aqui no Brasil onde temos excelentes profissionais como: Marcelo Calegari, Luiz Rico, Léo Elias, Leandro Longo, Alex Cobra, Thyago Dyovane, João Fernandes, Reni Fraga, Jack, Raoni, Nelson Sato, Rocky, Sandro de Castro, Lucas Walace, enfim, esses são apenas alguns que admiro e acompanho, mas poderia citar dezenas aqui. Então pergunte, questione, assista vídeos, troque conhecimentos e coloque tudo em prática dentro da academia.
Uma das maiores dádivas da vida é a curiosidade em aprender e ensinar. Não fique preso com seu ego e suas certezas absolutas dentro de uma bolha, olhe para fora, vai ver um horizonte cheio de novas informações e possibilidades.